Se seus investimentos parecem “andar para trás” mesmo sem você ter resgatado nada, respire: provavelmente é marcação a mercado — um ajuste contábil que atualiza o preço dos títulos ao valor de hoje. Entender esse mecanismo evita decisões impulsivas e transforma volatilidade em estratégia.
O que é marcação a mercado (MM)
A marcação a mercado é a atualização diária do preço de um ativo para refletir as condições atuais do mercado (juros, inflação, risco do emissor e liquidez). Em renda fixa, o preço é o valor presente dos fluxos futuros (cupons e principal). Se a taxa de juros exigida pelo mercado muda, o preço muda.
Por que isso existe?
- Transparência: você acompanha o valor realista do ativo hoje.
- Comparabilidade: permite avaliar diferentes títulos com critérios iguais.
- Gestão de risco: mostra o impacto de mudanças de juros e crédito no caminho.
Regra de bolso: juros ↑ → preço ↓ (e vice-versa). Quanto maior o prazo e taxa fixa, maior a sensibilidade.
Como a MM afeta a renda fixa
Prefixados
- Ganham valor quando juros caem (seu título fica “melhor” que os novos).
- Perdem valor quando juros sobem.
- Mais sensíveis em prazos longos.
IPCA+ (indexados à inflação)
- Sofrem com oscilações de juros reais no curto prazo (preço varia).
- Carregados até o fim, entregam IPCA + taxa real contratada.
Pós-fixados (CDI/Selic)
- Baixa oscilação de preço, pois a taxa acompanha o mercado.
- São os melhores para reserva de emergência e liquidez tática.
Levar até o vencimento x vender antes
- Carregar até o vencimento: você recebe a taxa contratada, e as variações no caminho viram “ruído contábil”.
- Vender antes: o preço pode estar acima ou abaixo do que você pagou — aí a oscilação vira ganho ou perda efetiva.
Como a MM aparece no seu extrato (fundos e títulos)
- Fundos de investimento marcam a mercado todo dia: a cota sobe ou cai com as taxas do momento. Não é “prejuízo realizado” até você resgatar.
- Tesouro Direto e CDBs com liquidez também oscilam no app: é o mesmo princípio.
- Tesouro Selic pode variar alguns centavos no curto prazo (por preço), mas tende a acumular positivamente com o tempo pela própria taxa.
Exemplos rápidos e didáticos
- Prefixado 2028 comprado a 12% a.a.
- Se os juros subirem para 14% a.a. em 2026, o mercado “pede” mais retorno. O preço do seu título cai — no papel — até que, no vencimento, você receba a taxa contratada se não vender antes.
- IPCA+ 2030 a IPCA + 5% a.a.
- Se os juros reais caírem para IPCA + 4% a.a., seu título tende a valorizar no mercado secundário.
- Pós-fixado (CDI 100%)
- Como acompanha o CDI, a sensibilidade é baixa. Ideal para meta sem data ou colchão.
Erros comuns que custam caro
- Vender no susto após uma alta de juros, realizando prejuízo que era só contábil.
- Ignorar o prazo da meta e travar dinheiro em títulos sem liquidez.
- Escolher só pela taxa e esquecer do risco de crédito e da qualidade do emissor.
- Comparar rentabilidade bruta, sem considerar impostos e custos.
Como investir bem convivendo com a marcação
1) Case prazo x objetivo
- Curto prazo e imprevistos: pós-fixados (CDI/Selic) com liquidez diária.
- Data definida (1–3 anos): prefixados curtos quando a taxa compensar.
- Metas longas (3–10+ anos): IPCA+ para proteger poder de compra.
2) Use uma escada de vencimentos (ladder)
Espalhe vencimentos ao longo do tempo (12, 24, 36 meses, etc.). Assim você reduz a chance de vender antes e dilui o risco de pegar juros ruins em um único momento.
3) Diversifique emissores e indexadores
Misture pós, pré e IPCA+ e não concentre em um só banco/empresa. Use os limites do FGC quando aplicável.
4) Tenha política de resgates
Defina critérios objetivos para resgatar (ex.: emergências reais, rebalanceamentos periódicos), e não por oscilações de curto prazo.
FAQ rápido
Marcação a mercado é perda real?
Não. É um ajuste de preço. Vira perda real apenas se você vender abaixo do seu custo.
Por que meu Tesouro Selic variou?
Porque o preço também é marcado a mercado. A duração é baixa, então a tendência é de acúmulo positivo ao longo do tempo.
Vale aproveitar quedas para comprar mais?
Se o horizonte for compatível, quedas por alta de juros podem abrir boas taxas. Priorize a estratégia, não o “achismo”.
Fundos também sofrem marcação?
Sim. A cota diária reflete MM. Por isso, fundos de duração maior oscilam mais.
Checklist antes de vender um título
- Meu objetivo mudou?
- Eu preciso do dinheiro agora?
- Existe alternativa com melhor taxa líquida hoje?
- Vender agora melhora meu risco ou apenas cristaliza um movimento de curto prazo?
Conclusão
A marcação a mercado não é vilã — é o termômetro que mantém seu portfólio honesto com a realidade. Quando você casa prazos, diversifica e carrega títulos até o vencimento (quando essa é a estratégia), a volatilidade diária vira informação, não motivo para pânico. Use a MM a seu favor para comprar melhor, vender com critério e investir com consciência e previsibilidade.