Preço não é “custo + um chute”. É estratégia: reflete posicionamento, margem desejada, impostos, custos variáveis e — principalmente — valor percebido. Neste guia prático, você aprende a precificar com método, proteger margem e usar preço como alavanca de crescimento (sem matar o caixa).
Fundamentos (em 1 minuto)
- Custo variável: cresce com a venda (insumo, comissão, frete, gateway, impostos sobre faturamento).
- Custo fixo: existe mesmo sem vender (salários, aluguel, SaaS).
- Margem de contribuição (MC): Preço – Custos Variáveis. Paga fixos e vira lucro.
- Ponto de Equilíbrio (PE): Fixos ÷ MC%. Abaixo disso, prejuízo; acima, lucro.
Regra de ouro: preço deve cobrir variáveis, contribuir para os fixos e capturar valor.
Passo a passo de formação de preço (modelo híbrido)
1) Calcule o custo variável por unidade
Inclua tudo que “escorre” com a venda:
- Insumos/produção
- Impostos sobre vendas
- Comissões / marketplace
- Frete / meios de pagamento (taxa do gateway)
2) Defina a margem de contribuição alvo
- B2B serviços: ≥ 50%
- Varejo físico: ≥ 30–40%
- E-commerce: ≥ 35–50% (frete e meios de pagamento pesam)
- Ajuste ao seu setor.
**3) Simule preço com mark-up por contribuição
Fórmula:
Preço = (Custo Variável) ÷ (1 – MC% alvo)
Ex.: CV = R$ 60; MC% alvo = 40% → Preço mínimo = 60 ÷ 0,6 = R$ 100.
4) Valide por valor percebido e benchmarking
- Liste resultados que você entrega (tempo poupado, risco reduzido, ROI).
- Compare posicionamento (básico, premium).
- Se valor percebido comporta mais, ajuste para cima.
5) Teste elasticidade (A/B simples)
- Mude preço em amostra pequena (5–10% da base) por 2–4 semanas.
- Compare conversão × MC%. Suba onde lucro total subir.
Impostos: não deixe comer sua margem
Trate impostos sobre venda como variável na planilha. Tenha duas células: alíquota e base. Ex.: se a alíquota efetiva for 8%, simule com 10–12% para folga (compensa promoções, perdas e taxas inesperadas).
Frete, gateway e marketplace (os vilões silenciosos)
- Frete: ofereça grátis condicional (ticket mínimo que preserva MC).
- Gateway: negocie por volume e antecipação seletiva (custo de capital).
- Marketplace: some take rate + logística + promoções; pode exigir preço diferenciado frente ao canal próprio.
Serviços e SaaS: precificação por valor
Troque hora por pacote com escopo e prazo.
Âncora de preço (3 degraus)
- Básico (resultado mínimo)
- Pro (resultado + velocidade/suporte)
- Premium (resultado + velocidade + risco transferido)
- A versão Pro tende a maximizar receita × margem.
Estratégias de preço (quando usar)
- Skimming (alto no lançamento, cai depois): inovação/escassez.
- Penetração (baixo para ganhar mercado): cuidado com margem e reajuste depois.
- Dinâmico (estoque e demanda): varejo e passagens; automatize com limites de MC.
- Assinatura (recorrência): reduz CAC payback; desconto para anual melhora caixa.
Promoções que não destroem margem
- Desconto em segundo item / bundle (eleva ticket médio).
- Cashback interno (volta em crédito, retém cliente).
- Frete grátis acima de R$ X (protege MC).
- Vouchers com validade curta para controlar impacto.
Exemplos práticos
E-commerce (camiseta)
- Insumo + confecção: R$ 35
- Impostos/marketplace/gateway/frete médio: R$ 25
- CV = R$ 60
- Alvo MC% 45% → Preço mínimo: 60 ÷ 0,55 = R$ 109,09
- Benchmark e valor de marca suportam R$ 119–129.
- Política: frete grátis a partir de R$ 249 (protege MC do carrinho).
Serviço B2B (implantação)
- Custo variável (horas técnicas + ferramentas proporcionais): R$ 2.400
- MC% alvo 60% → Preço mínimo: 2.400 ÷ 0,40 = R$ 6.000
- Pacotes: Básico R$ 6k (2 semanas), Pro R$ 8k (1 semana + treinamento), Premium R$ 12k (SLA + relatório ROI).
- Upsell: suporte mensal R$ 1.500 (margem alta).
KPIs de preço (reveja todo mês)
- MC% por SKU/serviço
- Ticket médio
- Preço médio por canal
- Elasticidade (Δ preço vs. Δ conversão)
- % receita em promoção (controle)
- Devoluções/chargebacks (qualidade e fricção de compra)
Reajuste anual sem perder cliente
- Indexe a um índice (inflação/insumos) e comunique 60 dias antes.
- Dê opção de anual antecipado no preço antigo (melhora caixa).
- Acrescente valor percebido (pequenas melhorias) junto do reajuste.
Erros comuns (e antídotos)
- Esquecer custos variáveis “miúdos” → crie checklist (taxas, embalagens, antifraude).
- Preço igual em todos os canais → custos diferentes pedem preços diferentes.
- Desconto genérico → use bundles/frete e preserve MC.
- Nunca testar → rode A/B leve todo trimestre.
- Prometer preço baixo sem caixa → alinhe a Rolling Forecast e ciclo de caixa.
Roteiro de 14 dias (execução enxuta)
Dias 1–3: levante CV por SKU/serviço (inclua taxas e impostos).
Dias 4–5: defina MC% alvo por linha.
Dias 6–7: simule preços (mínimo, base e premium) e bundles.
Dias 8–10: rode teste A/B em canal seguro (tráfego suficiente).
Dias 11–12: escolha o price book vencedor e documente regras de promo.
Dias 13–14: publique e conecte painel de KPIs (MC%, ticket, conversão).
Checklist (printável)
- CV por produto/serviço calculado (com impostos e taxas)
- MC% alvo por linha definida
- Preço mínimo (por contribuição) e preço por valor percebido
- Política de promoções que preserva MC
- Price book por canal (site, marketplace, direto)
- Reajuste anual e gatilhos de teste A/B documentados
- Painel de KPIs de preço ativo
Conclusão
Preço bem feito não é sorte: é método + posicionamento + disciplina. Quando você calcula o custo variável completo, mira MC adequada e ancora no valor entregue, o preço vira alavanca de margem e caixa — e seu negócio ganha previsibilidade para crescer.